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Ainda dia 11 - 17.12.1999 - Tel Aviv / Jerusalém / Deserto

Continuando com o dia de turismo... vimos nosso herói pela última vez indo para o sul em uma estrada imediatamente a oeste do Mar Morto, na direção de um lugar chamado Massada (ou Masada ou Metzada, dependendo de quem escreve).

Uma recapitulação sobre a topologia local... a leste de Jerusalém, depois de se descer a serra, o deserto é basicamente plano, sem maiores elevações até uma cadeia de montanhas que se vê ao longe, já na Jordânia. O lugar chamado Massada é uma exceção: é um morro de uns 400 metros de altura, com laterais quase verticais e o topo mais ou menos plano, com 600 por 300 metros. Como se pode notar, é um lugar muito bom para um posto militar, porque é muito fácil de defender (mais ainda em uma época sem mísseis e outros objetos voadores de longo alcance) e permite que se veja os inimigos de muito longe.

Isso foi notado bastante cedo, e o rei Herodes (aquele da Bíblia) construiu ali um palácio e estabeleceu aquele como um local de refúgio contra eventuais inimigos. Mas o evento histórico mais marcante que ocorreu ali foi uma batalha entre os conquistadores romanos e um grupo de rebeldes judeus conhecidos como "zelotes", ocorrida ao redor do ano 70. Os romanos cercaram o morro, atacaram o lugar com pedras lançadas de catapultas (algumas ainda estão lá) e construíram uma rampa numa das laterais para conseguirem chegar até os muros. A rampa também continua no lugar. No final, os zelotes optaram por matar a si mesmos (incluindo aí mulheres e crianças) para não cair sob o controle dos romanos. No folheto que conta esta história são citados os nomes de vários dos judeus envolvidos nela, e quase todos eles são nomes de ruas, bairros ou similares em algum lugar.

Depois disso, a fortaleza ficou sob o controle dos romanos até o século 6, depois foi ocupada por algum tempo por monges cristãos e depois foi abandonada até ser redescoberta no século passado. Continuam acontecendo escavações arqueológicas lá até hoje.

Mas, a visita. Felizmente para o pobre turista, existe um teleférico que leva do nível do chão até o topo da montanha, que curiosamente fica mais ou menos ao nível do mar. Também existe uma trilha que sobe, mas não deve ser uma caminhada muito agradável no sol do deserto. Chegando lá em cima, se está dentro do que sobrou do palácio ("dentro" é um termo relativo, porque a maior parte não é mais coberta). Existe uma maquete mostrando como se acha que era originalmente, e várias estruturas estão relativamente intactas. Uma delas é a sinagoga, que é simplesmente uma sala com degraus nas paredes para as pessoas sentarem, olhando para o centro. Segundo o guia, aquela é uma das primeiras sinagogas construídas fora de Jerusalém.

Também sobreviveu a maior parte do sistema de encanamento, que era usando não para distribuir água corrente pelo palácio, mas para dirigir a água da chuva as locais de armazenamento, que eram enormes cavernas logo abaixo do palácio. Havia um esquema de bombeamento para trazer a água para cima depois, quando ela ia ser usada, e até métodos de esvaziar parte do reservatório para limpeza, mantendo o resto cheio. Outra parte inteligente é a localização dos aposentos do rei, que ficam em um canto da montanha onde sempre há uma brisa fresca subindo sabe-se lá de onde (comprovei, a brisa está lá mesmo).

A rampa dos romanos fica no lado oposto ao teleférico, e é algo que impressiona, especialmente se se considerar que os judeus do alto da montanha não deviam estar olhando muito passivamente a construção daquilo. É larga o suficiente para se subir de carro, e chega a uns 30 metros abaixo dos muros (suponho que dali eles subiram com cordas, ou a rampa ia até o alto na época). Aliás, também impressionam as pedras atiradas pelas catapultas, que estão amontoadas em alguns lugares dali. São sensivelmente grandes, algo como o dobro de uma melancia típica.

Quase todas as paredes ainda de pé tem uma faixa preta pintada nelas em alguma altura; aquela faixa marca o que é a construção original e o que é reconstrução; abaixo, obviamente, é original, ou seja, tem pouco mais de 2000 anos de idade.

Curiosidades do local: telefone celular pega ali. Vi várias pessoas falando no telefone lá de cima. Vantagens de um país pequeno, imagino. Também tinha um telefone público perto da saída. E, indo para a saída, passamos por um gato, que eu nem imagino como chegou ali, ou do que se alimenta... Talvez de pombos, vi vários pombos "pedindo" comida para turistas.

Depois de descer, nos encaminhamos de volta para o norte para irmos à praia. Paramos em um agrupamento de casas que parecia incluir um pequeno hotel, um restaurante e uma bilheteria... Fomos almoçar antes de mais nada, estávamos todos com fome. Comi a versão "desktop" de um falafel, como descrevi no outro dia... muito bom, o azeite de oliva a mais faz uma boa diferença no sabor. E depois do almoço aproveitei para comprar um calção de banho, porque obviamente eu não tinha incluído isto na minha bagagem quando saí do Brasil.

A praia estava quase vazia, e de praia realmente não tinha muito. Em particular, não tinha areia, o que é mais estranho ainda se se considerar que era uma praia no meio do deserto. Mas tinha água.

O único motivo da parada na praia nesta excursão é para que os turistas possam comprovar, em primeira mão, que de fato a água do Mar Morto é tão densa como se diz, e de fato se flutua nela até sem querer. Para provar isto para os incrédulos de casa, o motorista fez questão que tirássemos fotos nossas "sentados" na água, lendo um jornal (o qual ele forneceu).

Falando de experiência pessoal, não é tão fácil quanto parece ficar naquela posição. Realmente se flutua na água, não se afunda nem de propósito, mas é difícil manter a posição que se quer, ainda mais quando se está preocupado em não deixar a água tocar os olhos. Se fica num equilíbrio delicado, e qualquer movimento inclina o corpo para um lado ou para o outro. Depois de alguns minutos de prática peguei o jeito da coisa e comecei a aproveitar, mas voltar a ficar de pé depois é meio complicado. Ainda mais com o fundo liso (e sem areia!). Depois de sair da água se nota que fica um resíduo na pele, parece oleoso mas na verdade é o excesso de sal. E onde respingou água nos meus óculos ficaram pequenas crostas de sal quando a água evaporou. Ah, a temperatura da água estava perfeita.

Depois do banho de mar, um banho de chuveiro para tentar se livrar do sal. Também tinha uma moça tomando banho para se livrar da lama; mencionei antes que esta lama é usada para cosméticos e cremes, e aparentemente algumas pessoas gostam de ir direto à fonte, sem intermediários.

E depois se voltou ao carro para se voltar à estrada e tomar o rumo de Jerusalém. Dessa vez entramos na cidade e demos um rápido passeio por ali, para aproveitar que ainda tínhamos algum tempo antes de anoitecer. Começamos indo ao Monte das Oliveiras, e no caminho passamos por um bairro primariamente árabe, aparentemente bastante pobre. As ruas eram muito estreitas, mas pareciam de mão dupla. No alto da subida, um cruzamento *muito* movimentado, sem semáforo, mas com várias pessoas tentando dirigir o tráfego aos gritos, sem serem levadas muito a sério pelos motoristas, que basicamente gritavam de volta. Acredito que fossem seguranças palestinos, a julgar por como estavam vestidos. Passamos por ali inteiros, não sem alguns sustos. Qualquer cruzamento de POA é fichinha perto daquele ali...

E passando por ali chegamos a um ponto com uma boa vista da Cidade Antiga, de onde dava para ver toda a extensão das muralhas. O lado que podíamos ver era quase todo cercado por um cemitério, e um dos portões desse lado estava bloqueado. Não meramente com algo na frente, mas com a muralha construída onde originalmente havia um muro. Segundo o guia, as profecias dizem que o Messias, quando voltar, vai sair de Jerusalém por este muro para iniciar o julgamento das almas, e por isto o cemitério ali: as pessoas que estão ali pagaram muito para serem enterradas próximo ao muro e serem julgadas primeiro (o que, na minha opinião, deve ser um pecado que garante condenação, mas tudo bem). No dia seguinte ouvi uma história completamente diferente para isto, e aparentemente mais plausível.

Algo que não se deve esquecer é que Jerusalém é uma cidade sagrada para três religiões, cristianismo, judaísmo e islamismo, por razões totalmente diferentes. Assim a mistura de religiões é bastante visível. Também é importante lembrar que o clima de tolerância entre religiões diferentes não é algo muito recente (nem muito forte ainda hoje), então conflitos entre os vários ocupantes da cidade se sucederam inúmeras vezes. Assim, o domo dourado que hoje é a característica visual mais marcante de Jerusalém é uma mesquita, que fica no lugar onde ficava o Primeiro Templo dos judeus, a primeira sinagoga construída. Por mais que os judeus queiram, eles são proibidos legalmente e religiosamente de destruir aquela mesquita e construir uma sinagoga no lugar (a lei de Israel proíbe a destruição de templos de qualquer religião, e os judeus religiosos acreditam que estão sendo punidos por Deus com aquela mesquita ali, e que ele vai tomar conta do assunto quando achar que a punição pode acabar).

Seguindo o caminho, fez-se uma rápida parada em uma loja de souvenirs (onde não compramos quase nada) e foi-se para a Catedral do Gethsemane, onde fica um jardim de oliveiras que, alega-se, datam da era de Cristo, e onde ocorreu o evento da prisão de Cristo. Mais sobre isto no relato do dia seguinte.

Depois fez-se uma parada rápida em uma outra igreja, esta grega, que estava alagada; ela fica ao pé do morro, havia chovido muito forte no dia anterior e, bem, a capela encheu de água. Literalmente, ela ficava abaixo do nível do solo. Alguns freqüentadores tiveram que ser salvos por mergulhadores. Aquela capela, diz-se, é onde fica o túmulo de Maria. Existe outra, em outro canto da cidade, que diz o mesmo. Tenho certeza que pelo menos uma está errada.

Também por ali havia uma capela antiqüíssima, escavada na rocha, que acredita-se que seja onde Jesus e os apóstolos se reuniam para orar (não era uma capela na época, claro). Esta não estava alagada e dava para visitar, com cuidado para não bater no teto. Estou me comvencendo que as pessoas realmente eram muito mais baixas naquela época.

Depois disto estava acabando o dia, e rumamos para a saída da cidade e para a estrada para Tel Aviv. Dentro da cidade ainda, era muito visível a separação entre bairros árabes e judeus, até mesmo nos letreiros do lado de fora das lojas. Não que um fosse menos ilegível que o outro, claro.

De volta a Tel Aviv, aproveitei que era cedo (embora noite) e fui ao cinema, assistir "Double Jeopardy" ("Duplo Risco" em português, acho). Repetiu-se tudo que houve na primeira vez, mas nesta eu sabia que os lugares eram numerados e encontrei a poltrona certa, e já estava preparado para o intervalo no meio do filme.

O dia acabou com uma janta em um lugar chamado "Terminal", próximo ao hotel. Não lembro o que comi, mas acho que foi algum tipo de massa. Fora isto, dormir cedo para acordar cedo no próximo dia.

Na próxima parte: mais história antiga, alguns sinais do Natal e divisões sociais dentro dos muros.

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