Na sexta-feira passada, dia 26, foi feriado na Austrália. Nessa data é celebrado o Australia Day, que marca a chegada da primeira frota oficial a Sydney e a fundação da colônia de Nova Gales do Sul (New South Wales), no século 18.
Nesse dia ocorrem eventos pelo país todo, como shows, premiação dos australianos do ano pelo primeiro-ministro, queima de fogos, desfiles, etc. Ocorrem também cerimônias de cidadania, em que estrangeiros recebem um certificado do governo federal que os oficializam como cidadãos australianos. Eu e a Cris participamos da cerimônia organizada pela Prefeitura de Melbourne. Ou seja, desde sexta-feira, somos australianos.
Resolvemos esperar para compartilhar a notícia até ter o documento nas mãos, o famoso "ver para crer". Porque, como o processo de imigração, o de cidadania também foi longo.
Até o ano passado, imigrantes com visto permanente poderiam solicitar cidadania após dois anos de residência no país (as leis estão mudando e os novos imigrantes precisam esperar quatro anos e passar por teste de inglês e sobre a história e os valores australianos). Em junho fizemos o pedido.
Só no fim de agosto fomos chamados para a entrevista. Na entrevista é preciso apresentar documentos e responder a perguntas sobre direitos e deveres de um cidadão australiano. Depois recebemos uma carta do governo federal dizendo que havíamos sido aprovados na entrevista e, em aproximadamente três meses, seríamos convocados para uma cerimônia.
Três meses depois, nada. Ligamos para o "departamento responsável" e o atendente disse para esperar um pouco mais, pois deveríamos ser chamados para a cerimônia do Australia Day, em janeiro.
Vale ressaltar que as cerimônias são geralmente realizadas em datas especiais, como feriados (diz-se que o país ganha mais novos cidadãos no Australia Day do que em qualquer outra data).
Em dezembro finalmente recebemos outra carta, desta vez sobre a cerimônia, na Prefeitura de Melbourne (porque moramos no centro) - a cerca de 15 minutos a pé de casa.
Chegamos ao local por volta das 8h40. Após a identificação, os candidatos receberam o programa do evento e foram encaminhados aos respectivos assentos (no total, 95 pessoas; uns cinco ausentes, acho).
Em cada assento também havia uma cópia do juramento - há dois tipos; um que inclui a palavra Deus e outro que a exclui.
Os candidatos podem convidar parentes e amigos, filmar, tirar fotos, etc. Os convidados ficam na parte de trás do salão (como em um tribunal). Há também repórteres de rádio e TV (que privilegiam candidatos que parecem "típicos"; um com vestimenta africana, que parecia um pai-de-santo, e um com saia escocesa fizeram o maior sucesso). Eu devia ter ido de bombacha. Mas é estranho ir com vestimenta típica a uma cerimônia em que se obtém uma nova cidadania.
O mestre de cerimônias, um francês que passou pelo mesmo processo, explicou como seria o evento - que foi ótimo: curto (cerca de uma hora), objetivo e bem organizado. Começou oficialmente com a chegada do prefeito John So (chinês naturalizado australiano), que fez um breve discurso e anunciou um coral de jovens, que apresentou a mais famosa canção do país, "Waltzing Matilda".
Depois os candidatos de cada fila de assentos (mais ou menos dez pessoas por fila) foram chamados até a frente do salão, onde fizeram o juramento. A leitura é feita em pequenos grupos para garantir que as pessoas realmente façam o juramento. Funciona mais ou menos como padre em casamento. O prefeito começou com "repitam comigo" e foi falando cada verso:
"A partir deste momento, (sob Deus)
eu prometo minha lealdade a Austrália e a seu povo
cujos preceitos democráticos eu compartilho, cujos direitos
e liberdades eu respeito, e cujas leis eu apoiarei e obedecerei."
Pobre do prefeito, que deve ter repetido o mesmo juramento umas oito vezes (só naquela cerimônia). Inicialmente são chamados os que optaram pelo juramento com a palavra Deus, depois os que escolheram o outro juramento.
Aí o mestre de cerimônias foi citando cada nome da respectiva fila (como em formatura), enquanto o prefeito entregava o certificado, dando os parabéns e aperto de mão. Depois cada um ganhava uma muda de planta nativa e retornava ao assento (doamos as mudas para um conhecido que tem uma casa fora da cidade, porque não podemos ter planta no apartamento). Vale ressaltar que o mestre de cerimônias contou com a ajuda de uma pessoa com características asiáticas na leitura de nomes orientais. O francês ficou com os demais nomes (especialmente os que pareciam indianos, muçulmanos e africanos); ele leu os nossos. Cerca de 90% dos candidatos eram asiáticos.
A cerimônia se encerra com um aplauso coletivo e o coral cantando o hino nacional. A seguir, todos (novos cidadãos e seus convidados) se confraternizam em outra área do salão, onde há café, chá e suco à disposição, além de pães doces e bolos (uma empresa de bufê é responsável por todos os eventos que ocorrem na prefeitura, então o serviço foi excelente). E, na saída, era preciso entregar os documentos para obter o título eleitoral (como no Brasil o voto é obrigatório).
Agora já é possível solicitar o passaporte australiano, que não invalida o brasileiro. Ou seja, vamos manter as duas cidadanias. Também podemos ser candidatos a empregos que exigem cidadania.
Faz quase três anos que chegamos aqui. Como o tempo voa. Ainda acredito que passar um tempo no exterior é fundamental antes de uma mudança definitiva. Claro que não há aquele deslumbramento inicial e muitos até pensam que há falta de entusiasmo com o novo país. Por isso não esperem de nós comentários exaltando a vida no exterior, elogios sobre como o país aqui funciona e coisas do gênero. Como sempre dizemos, o mundo é todo igual. E aqui também há problemas!
Viver no exterior é uma experiência enriquecedora, um imenso aprendizado, mas não é fácil, porque recomeçar exige um grande esforço e a vida apresenta muitos desafios inerentes a essa mudança. Mas enquanto estivermos bem e felizes aqui, vamos continuar na Austrália.