Um médico de Porto Alegre chamado Marcelo, que mora em Toronto, publica um blog chamado A Sopa no Exílio. Não conheço o Marcelo, mas de vez em quando leio o que ele escreve, e freqüentemente são coisas interessantes.

Em um artigo recente, ele escreve sobre multiculturalismo no Canadá. A experiência dele é que, em vez de uma integração de culturas, o que existe é um monte de comunidades semi-isoladas que só por acaso estão em outro país. Ou seja, em Toronto há um mini Portugal, uma mini Grécia e assim por diante, e os imigrantes (e mesmo filhos e netos de imigrantes) não se integram ao seu novo país.

Isso é bastante similar ao que vejo em Melbourne. Existe uma comunidade grega com as suas lojas, seus restaurantes, seu bairro... idem para libaneses, sudaneses, vietnamitas, judeus etc. As pessoas não se "misturam" ao país, continuam com a sua cultura, os seus costumes, a sua língua e formam o seu país aqui dentro, onde só se relacionam com quem vem do mesmo lugar. E, ao redor de tudo, existe uma Austrália "de verdade" feita quase somente de descendentes de europeus, principalmente britânicos.

Até certo ponto isso não é ruim. Lógico que mudar de país não significa abandonar toda a sua cultura e se transformar em australiano de uma hora para a outra; é bom que os costumes "originais" continuem existindo, que a língua do país de origem seja passada de pais para filhos, que a comida em casa continue com o sabor original... a gente tem isso no Brasil também.

Mas isso cria problemas bem óbvios. Um deles: o que acontece com a cultura do país que recebe os imigrantes? Se a Austrália acaba se tornando um "amontoado" de comunidades étnicas semi-isoladas, qual é a cultura australiana? Faz sentido falar em uma cultura australiana nesse contexto? Ao trazer os seus costumes e ignorar a cultura local, os imigrantes não estão fazendo o mesmo que os colonizadores de séculos atrás?

Ainda esta semana um programa de TV apresentou uma entrevista com um professor da Universidade de Sydney Macquarie University, em Sydney, defensor de um limite na imigração de africanos e asiáticos. Um de seus argumentos é justamente a defesa da cultura e do "way of life" australiano. Outros argumentos eram ao menos um pouco racistas, o que tira muito sua credibilidade, mas na parte sobre a cultura eu acredito que ele tenha uma certa razão.

O outro problema vem do fato de que existem vários grupos de imigrantes, e em alguns casos há rivalidades históricas entre eles. Não como entre brasileiros e argentinos, mas como entre sérvios e croatas. E como eles formam seus mini países aqui, as rivalidades continuam e acabam por irromper quando as comunidades entram em contato (por exemplo, em jogos de futebol).

Além disso, a falta de integração acaba por ser quase um círculo vicioso: imigrantes ficam apenas nos seus grupos, e acabam sendo vistos como isolados ou "estranhos" pelos locais, o que leva a discriminação, o que leva a mais isolamento e assim por diante. O que acaba por levar, no extremo, a eventos como o de Londres, em que pessoas que vivem em uma sociedade ocidental não se sentem parte dela, mas sim como inimigos.

A minha opinião é que quem vai para um país diferente do seu precisa se integrar com a sociedade na qual está entrando: falar o idioma, participar de eventos, interagir com locais e imigrantes de outras nacionalidades. Isso não quer dizer jogar fora a sua cultura, mas é possível chegar a um meio termo. Quem emigra está indo atrás do que esse país oferece, e isso inclui sua cultura e seus costumes; na verdade, o que o país oferece é um resultado dessa cultura. Isolar-se dentro da própria comunidade não é bom nem para o imigrante, nem para os descendentes, nem para o país que os recebe.