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Dia 12, 24/03/1999 - San Francisco Bay Area

Mais um dia nublado e úmido na California... e eu continuo com o turismo focado na South Bay. O meu plano era, caso este fosse um dia ensolarado, descer para Monterey e Carmel, uns 100km ao sul, mas com o tempo do jeio que estava não valia muito a pena. Ficou para outro dia.


Então, segui o mesmo tipo de turismo do dia anterior, e fui visitar o museu da Intel. A sede da Intel fica em um bloco de prédios azuis e brancos próximos à 101 em Santa Clara, um pouco ao sul de Mountain View, quase ao lado de um grande parque de diversões, e o museu é aberto a visitação pública e fica no que me parece ser o prédio principal deles.

Precavido, antes de sair de casa eu entrei no website do museu para pegar as instruções de como chegar lá. Anotei tudo direitinho, peguei o carro e fui. Segui as instruções à risca: 101 sul, essa saída, ali à esquerda, esquerda de novo, direita, esquerda, entrar no primeiro estacionamento à esquerda, estacionar e aguardar o shuttle para o museu. Caí no meio de um canteiro de obras. Parei o carro onde deu, achei alguém que parecia o chefe ali, expliquei onde eu queria chegar e mostrei as instruções para ele; ele me disse que as instruções estavam desatualizadas, o shuttle não existia mais e agora se estaciona no proprio prédio do museu, e daí ele me explicou como chegar lá (eu tinha passado por ele no caminho).

Chegando lá, descobri que o museu tambem estava em obras! Só uma pequena parte dele estava aberta, e era justamente a parte sobre a história dos chips da Intel. A Intel foi fundada por um grupo de engenheiros da Fairchild em 1970; a Fairchild foi a empresa que inventou o circuito integrado (a colocação de vários componentes na mesma "pastilha"), e a Intel usou este conhecimento para inventar o microprocessador em 1971. O prédio onde ocorreu esta invenção fica na divisa entre Palo Alto e Mountain View, próximo a onde hoje é a sede da Sun e a uns 500m do escritório da Nutec lá, e hoje é ocupado por alguns escritórios; o antigo prédio da Fairchild fica a uns 50m dele, e hoje tem uma loja de material náutico.

O primeiro processador da Intel foi o 4004, e ele foi feito sob encomenda para uso em calculadoras; a Intel não tinha muita idéia do que poderia ser feito com esta invenção ainda (nem eles nem mais ninguém). Quando saiu a nova versão, o 8008, é que o mercado de microcomputadores começou a se formar. Depois desse a seqüência é conhecida: 8080, 8086/8088, 80186 (usado em uns poucos PCs), 80286, 80386, 80486, Pentium, Pentium Pro, Pentium II e Pentium III, com siglas como SX, DX e MMX espalhadas no meio ao acaso. Eles também fazem muitos outros tipos de chips mais especializados (como o i860) e mais genéricos (chips de memória, por exemplo). A exibição deles seguia a ordem cronológica, comparando a velocidade e capacidade dos vários processadores (eles tinham até um 4004 lá!), indo até o P3 (também tinha um PC original rodando uma planilha e um AT-286 rodando Windows, acho que o 2.0). Uma coisa interessante sobre o P3: quem já viu um chip aberto sabe que ele é multi-colorido, cheio de reflexos similares aos da superfície de um CD mas menos organizados; já a superfície do P3 é fosca, quase sem brilho. Segundo eles isto é porque a concentração dos componentes é tão grande que não se formam áreas grandes o suficiente para refletir a luz muito bem; inclusive, a pastilha do chip propriamente dito é menor que a do P2.

E quem viu propagandas recentes da Intel viu aqueles "astronautas" deles, que eles vêm usando em todos os comerciais ultimamente. E parece que isso dá dinheiro: eles estão vendendo bonequinhos dos astronautas (o nome oficial é "Intel bunny"). Tinha vários desses no museu, e vi à venda na Fry's.

Falando na Fry's, depois de sair do (mini-)museu de Intel, fui visitar outra filial da Fry's, a de Palo Alto. Essa era minha velha conhecida de anos, mas está muito diferente agora, com quase o dobro do tamanho de antes. E eu levei quase dez minutos dentro da loja para perceber que ela tinha crescido... E lá dentro notei que esta história do "Y2K bug" está ajudando muita gente a ganhar dinheiro sem nem tocar em código-fonte mas com um bom senso de humor: vi à venda latinhas de "Y2K Bug Spray", inseticida para o bug do ano 2000. Depois disto, numa livraria, vi um cartaz anunciando "1999 calendars, 99 cents"; embaixo, em letras bem menores, "sorry, not Y2K-compliant".

E usei a tarde chuvosa para passear no centro de Palo Alto... Palo Alto é uma cidade muito influenciada pela Universidade de Stanford, que fica bem próxima ao centro da cidade; inclusive, a avenida principal é a University Avenue, e vai da 101 até a praça central da universidade. E o centro da cidade reflete a presença do público universitário: muitos bares e cafés, livrarias, restaurantes naturais, dois cinemas "alternativos" (um, o Stanford Theater, só passa filmes antigos) e sempre muito movimento (concentrado num espaço de umas sete ou oito quadras da University). É muito difícil estacionar na rua por lá em horários de mais movimento (ou seja, quase todo o dia) mas existem vários estacionamentos gratuitos nas vizinhanças, então o problema some.

Fiz várias "paradas" por lá: a Stacey's Bookstore foi a primeira. É uma cadeia local de livrarias (existem três ou quatro) que tem o melhor setor de livros de informática que eu já vi em uma livraria não dedicada ao assunto. Eu ainda tenho o cartãozinho de "cliente freqüente", que dá 10% de desconto em cada compra e um bonus de 10 dólares a cada 200 de compras; as compras deste dia me deram um bônus para a próxima vez...

Um pouco adiante na mesma rua existe uma loja especializada em quadrinhos, de Pato Donald a Sandman passando por Asterix e Dilbert. Fiquei um bom tempo ali, mas acabei saindo só com um exemplar de um Tio Patinhas "clássico", com uma daquelas histórias "épicas" que apareciam quando eu era criança e eu adorava ler. Depois ainda passei na Borders, outra livraria grande; esta ocupa o espaço que era de um antigo cinema, o Varsity, o mais "clássico" de Palo Alto, que fechou a uns quatro anos. Foi naquele cinema que eu assisti o primeiro filme que eu vi nos EUA, "Sirens", um filme australiano com, eu acho, o Hugh Grant. Como na época o meu inglês não era lá estas coisas, e o sotaque australiano tambem não é lá essas coisas, não entendi quase nada do filme... Saí da livraria com um exemplar da Veja! E da semana mesmo! Nunca tinha visto a Veja a venda nos EUA, embora eu soubesse que em algum lugar existia... saiu por 6 dólares.

E, claro, também houve a parada obrigatória na Starbucks, que afinal de contas estava frio, chovendo e eu precisava do meu meio-litro de café :-)

Nada de muito interessante aconteceu no resto do dia... em particular, a chuva não parou. Passei a noite em casa comendo pizza, e esperando tempo bom no dia seguinte...

Dia 13, 25/03/1999 - San Francisco Bay Area / Monterey / Carmel

Amanheceu um dia nublado, mas com a séria perspectiva de sair sol mais tarde; pelo menos foi isso que o locutor do rádio estava prometendo. Então, me mandei para o sul, para as cidades costeiras de Monterey e Carmel.

Logo ao sul da Baía de San Francisco, ainda à beira do mar, existe uma cadeia de montanhas, as Santa Cruz Mountains. A altitude máxima chega perto dos 1500m, ou seja, não é o tipo de montanhas que tem neves eternas no topo, mas é alto o suficiente para fazer diferenças no clima. Por exemplo, lá em cima neva no inverno, mas raramente, e neblinas são muito comuns. E do outro lado das montanhas fica a cidade de Santa Cruz (sede da SCO) e, mais ao sul, Monterey e Carmel na beira da baía de Monterey. São duas cidadezinhas turísticas à beira-mar muito bonitinhas, e lar de muita gente com bastante dinheiro.

Então, indo para o sul, o meu caminho me levava através das Santa Cruz Mountains. O caminho mais simples, e o que eu conhecia melhor por já ter feito antes, era pegar a Hwy. 85 sul, depois a 17 sul cruzando as montanhas, e depois a Hwy. 1 até Monterey. A 85 é uma estrada relativamente nova, concluída a menos de 5 anos, que vai de Mountain View até um pouco ao sul de San Jose, num traçado mais ou menos de semi-círculo aberto para o leste; por ser nova a estrada é excelente (piso muito melhor que o da 101) e menos congestionada; tambem é proibido o tráfego de caminhões na parte mais nova, aberta em 1996.

Já a 17 é uma típica estrada de montanhas. Estreita (duas pistas em cada direção) e muito sinuosa, mas muito bem sinalizada e segura. Nesta estrada descobri que o carro em que eu estava odeia subidas, e que é preciso um jeitinho para convencer um carro automático a reduzir marchas; pelo menos naquele, se precisa pisar o acelerador até o fundo antes que ele se convencesse da necessidade (depois li no manual de outro carro da Ford que este é o procedimento "oficial"). Tanto a subida quanto a descida ocorrem muito rápido nesta estrada, em menos de uma hora se sobe até o alto das montanhas (pouco mais de 4000 pés) e se desce do outro lado; aliás, o carro se deu muito melhor na descida...

Do outro lado das montanhas fica a cidade de Santa Cruz, outra das inúmeras cidades californianas com nome de santo. Só na área geral de San Francisco em lembro de Santa Rosa, San Rafael, San Carlos, San Bruno, San Jose e Santa Cruz. Mais ao sul tem Santa Barbara, Santa Monica e outras... acredito que isto sejam reminescentes da colonização espanhola (e, um pouco, portuguesa) da área, que incluiu até missões jesuítas similares às do Rio Grande do Sul.

Ao sul de Santa Cruz pegamos a Hwy. 1, que é a famosa estrada que percorre a costa da Califórnia, com algumas paisagens lindas e que se vê muito em filmes. Neste trecho em particular, entre Santa Cruz e Monterey, ela se afasta um pouco da costa e percorre uma área mais rural até quase Monterey; em um bom trecho ela é uma estrada "de interior", com só uma pista em cada direção e sem divisória central (neste trecho é obrigatório o uso de faróis acesos durante o dia; aliás, em todo o trecho de montanhas da 17 também); se passa por várias plantações de alcachofras, milho, morangos, laranjas e outros vegetais não identificáveis (as de alcachofras tinham placas indicando o que era, eu não iria reconhecer a planta sem isto).

Tubarões
Cheguei em Monterey ainda com tempo nublado, passei pelo centro da cidade e fui visitar o Monterey Aquarium. O Aquarium, como o nome deixa claro, é basicamente um zoológico de animais aquáticos (com plantas, também). Uma das áreas mais visitadas dele é onde ficam os tubarões, que compartilham um tanque enorme com inúmeros outros peixes, aparentemente de maneira pacífica. Estava ocorrendo também uma exposição especial com animais e plantas de áreas profundas do oceano, que geralmente não são vistos por ninguém porque não aparecem em águas rasas. Eu havia lido sobre esta exposição na Veja e até visto no Fantástico (ou Jornal Nacional?) antes de viajar, então eu estava bem interessado.

Uma das coisas que se descobre ali é que a Monterey Bay não é tão bem comportada quanto a San Francisco Bay: não muito longe da costa começa um canyon submarino com mais de dois quilômetros de profundidade, que foi de onde vieram muitos dos animais da exposição. Geograficamente falando, a Monterey Bay se parece mais com a Baía da Guanabara enquanto que a San Francisco Bay se parece mais com a Lagoa dos Patos (é mais fechada), o que favorece este aspecto mais "selvagem" da de Monterey.

Ah, e os animais expostos eram, bem, estranhos. Havia uma profusão de animais brilhantemente vermelhos, e a explicação científica para isto é que, em lugares muito fundos, vermelho é a única cor visível, uma vez que todas as outras freqüências luminosas são filtradas pela água. Outros animais não-vermelhos tinham sua própria fonte de luz, inclusive alguns peixinhos minúsculos virtualmente transparentes com ossos fosforescentes. Me parece que isto deixaria eles muito visíveis para potenciais predatores, mas como eles ainda existem o problema não deve ser grande (e quem é que ia querer comer um esqueleto brilhante ?)

Outras áreas interessantes: em muitos lugares eles estavam mostrando o funcionamento interno do aquário; por exemplo, dava para ver o equipamento de captação e processamento da água do mar que eles levam para dentro dos aquários, e os métodos de limpeza dos canos (a cada poucos meses eles forçam uma grande "rolha" plástica pelos canos para tirar os animais que se prendem nas paredes). Em outro lugar havia uma piscina com arraias onde se poderia, teoricamente, tocar nelas, mas naquela hora elas estavam meio tímidas e recolhidas a um canto distante do público (e a água era gelada!). O tanque das anchovas também é uma visão interessante: elas passam o tempo todo girando pelo tanque, como um bloco único, no sentido anti-horário; outro cara que estava ali comentou que parecia um rinque de patinação... E o restaurante do aquário, hipocritamente, serve peixe.

Durante a manhã e início da tarde, enquanto eu estava no aquário, o sol começou a aparecer timidamente pelo meio das nuvens, prometendo uma tarde bonita (e de mar agitado). Logo, saí do aquário e segui a rua pela beira da praia. Assim que deu parei e fui dar uma caminhada por uma pracinha que ficava à beira da água, e que àquela hora tinha bastante gente (e mais gaivotas ainda).

Vista do Aquarium
Seguindo na direção de Carmel, um ponto turístico interessante é a "17 Mile Drive", uma estrada de, lógico, 17 milhas por dentro e ao redor de uma área muito bonita à beira-mar. Paga-se para entrar na estrada ($7.50) a não ser que se more ali dentro; por outro lado, quem mora ali dentro, a julgar pelas casas, poderia pagar os 7.50 a cada entrada sem se preocupar muito...

Eu já tinha feito parte deste caminho antes, e sabia que era muito bonito; fiz várias paradas para fotos, apesar da promessa de uma tarde bonita não haver se concretizado: o dia estava mais nublado agora do que antes, e ficando mais frio. Numa das paradas fui assediado por esquilos quase na beira da água; já achei estranha a presença de esquilos ali, e mais estranho ainda quando eu fiz menção de chegar perto e, ao invés de fugir, o esquilo veio na minha direção; estendi a mão, ele chegou perto, cheirou, não achou comestível e foi embora.

Uma parada interessante é a do cipreste solitário (Lone Cypress); é um grande cipreste que fica, realmente, sozinho em uma rocha na beira do mar, uns 15 metros acima da água; ele tem mais de 150 anos, e agora tem vários reforços (cabos de aço e toras de madeira) para continuar em pé ainda por um bom tempo.

Quase no fim da estrada, depois de um bom tempo olhando praias e belas paisagens, parei em uma lancheria junto a um campo de golfe para comer um sanduíche. Apesar do frio, fui me sentar numa mesa ao ar livre; eu era uma das duas únicas pessoas ali, e a única comendo, e os pássaros notaram isto bem rápido. Em poucos minutos eu tinha a companhia de uma gaivota ao meu redor, me olhando atentamente e chegando perto muuuuito devagar. Ela foi chegando, chegando, e pulou para o banco na minha frente; logo depois pulou para o alto da mesa, mas no canto oposto ao meu (era uma mesa para quatro pessoas). Mais perto que isto ela não chegou; ficou ali parada me olhando. Mas todo mundo que passava olhava a situação e dava risada, devia estar engraçado... Quando eu saí dali ela e outra gaivota pularam para onde eu estava, procurando eventuais farelos e restos do sanduíche.

Enquanto eu comia se repetiu um fenômeno interessante: pessoas desconhecidas me pediram como se chegava ao campo de golfe que ficava ali perto; isso que eu, com uma máquina fotográfica ao meu lado, era obviamente tão turista quanto elas (mas eu sabia a resposta). Já comentei isto antes, acho: em qualquer cidade onde eu já estive por mais do que algumas poucas horas, alguém já me parou para pedir informações na rua; até em Paris me pediram informações em francês, e eu não falo francês (e respondi!). Eu provavelmente dou a impressão de saber o que estou fazendo...

Depois dali fui para um passeio por Carmel. Ela é uma cidadezinha muito simpática, com inúmeras lojinhas de todos os tipos e muitos turistas, mesmo nesta época do ano e com o tempo feio do jeito que estava. E depois fui me dirigir para casa, porque estava acabando o dia e eu não queria pegar a estrada à noite e (potencialmente) com chuva.

O caminho de volta, obviamente, era o oposto da ida: Hwy. 1 até Santa Cruz, depois a 17 até a 85 e a 85 até em casa. Teve o congestionamento esperado da 1 perto da junção com a 17, mas nada mais de anormal até se chegar na 85.

A intersecção da Hwy. 17 norte com a 85 norte é o cruzamento mais complicado que eu conheço; é muito fácil errar algum detalhe e ir parar de volta na estrada em que se estava, mas indo na direção errada. Eu sabia que era complicado porque lembrava de quase ter errado o caminho na última vez que tinha passado por ali (em que eu não estava dirigindo), mas eu não lembrava exatamente como era; aliás, já não lembro de novo. Lembro que é complicado porque a saída para o norte e para o sul são juntas, e quem vai para o norte parece trocar de estrada duas vezes ao invés de uma, mas não lembro detalhes; por sorte, o lugar é incrivelmente bem sinalizado, mas é preciso cuidado porque às vezes os sinais não dizem o que se espera.

A última atividade do dia foi uma parada em um Jamba Juice para um "smoothie". Jamba Juice é uma cadeia nova que pode ser definida como o Starbucks dos sucos e similares. E um "smoothie" é um sorvete quase líquido, mais ou menos como um milk-shake sem o leite; se alguém tiver uma definição melhor ou um nome em português, ficarei grato. Eles tem uns sabores muito interessantes misturando frutas, com nomes como "Peach Pleasure" e "Hawaiian Lust"; ainda, para quem curte suplementos vitamínicos, pode-se colocar na bebida algo que eles chamam de "boost", um conjunto de vitaminas que também vem em vários tipos, um para cada tipo de pessoa ou atividade (especifico para mulheres, ou atletas, ou estudantes etc.).

Na próxima parte: a noite de San Francisco, fondue, Armani e Twin Peaks.

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